Por Isa Lorena
Para compreender quem somos, precisamos primeiro entender de onde viemos.
Para compreender quem somos, precisamos primeiro entender de onde viemos.
Quais histórias compõem a nossa própria história, quais foram as lutas dos nossos antepassados, quais os seus anseios e princípios. Novembro, mês da consciência negra, é para muitos o momento de repensar os fatos, a etnia, as origens, enfim, toda essa cultura que nos cerca e classifica. Envoltos numa atmosfera de conceitos máximos tais como o capitalismo desenfreado e o declínio de antigos valores morais, vem a necessidade do questionamento: afinal, onde estão nossas raízes?
Foi em 20 de novembro de 1665, que Zumbi, considerado quilombo maior dos palmares, foi assassinado. O líder quilombo representou a maior e mais importante comunidade de escravos das Américas. No período da escravidão, os negros fugitivos se escondiam no meio das matas e as comunidades alí agrupadas, eram chamadas de quilombos, que representaram uma das formas mais contundentes de resistência e combate à escravidão. E em quais matas se escondem os negros hoje, ou ainda: que negros ainda se escondem em matas fechadas?
Há alguns anos, o poeta gaúcho Oliveira Silveira sugeria ao seu grupo, que o 20 de novembro fosse comemorado como o “Dia Nacional da Consciência Negra”, pois era uma data “mais significativa para a comunidade negra brasileira”, do que o 13 de maio. “Treze de maio traição, liberdade sem asas e fome sem pão”, assim definia Silveira o “Dia da Abolição da Escravatura” em um de seus poemas. Então em 1971, o 20 de novembro foi celebrado pela primeira vez, e a idéia se espalhou por outros movimentos sociais de luta contra a discriminação racial. No final dos anos 70, a data já aparecia como proposta nacional do Movimento Negro Unificado. “Ter consciência negra é entender que somente aliados aos trabalhadores, à juventude e aos demais setores marginalizados, negros e negras poderão construir uma sociedade em que seja possível eliminar as muitas e nefastas faces do racismo”, afirma o jornalista Wilson Silva, no portal da Mídia Independente.
Muito se pesquisa e se constrói sobre o assunto. A UNESCO iniciou em 1999, um Projeto intitulado Tráfico de escravos e escravidão, dentro do Programa Memória do Mundo, que vem tornando possível a identificação da informação e da documentação existente no mundo em relação à escravidão e ao tráfico de escravos. Em Salvador acontecem em novembro comemorações e homenagens aos líderes negros que fizeram da história, base aliada para grandes lutas, armadas ou não. A socióloga e coordenadora executiva do Ceafro, Vilma Reis, afirma que o racismo continua fazendo parte da sociedade, fazendo com que a escravidão seja “reeditada” todos os dias por atitudes conscientes ou inconscientes. O Ceafro é um Centro de Estudos Afro-Orientais da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia, criado em 1959 para o estudo, a pesquisa e ação comunitária na área dos estudos afro-brasileiros, e das ações afirmativas em favor das populações afro-descendentes, bem como na área dos estudos das línguas e civilizações africanas e asiáticas. “Não é fácil ser negro em uma cidade que diz que ser negro é feio”, afirma Vilma.
Pesquisas recentes divulgadas em 2006 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) e pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese) mostram uma realidade mais precária enfrentada pelos negros no mercado de trabalho, em comparação com a enfrentada pelos não-negros, quando se consideram dados como as taxas de desemprego, a presença nos diferentes postos de trabalho e os valores dos rendimentos, entre outros.
Segundo o IBGE, em Salvador, por exemplo, 10,3% dos negros (pretos e pardos) ocupam cargos de chefia enquanto que a porcentagem entre os considerados não-negros (brancos e amarelos) é de 29,6%. Segundo boletim do Dieese, considerando diferentes ramos de atividade, a proporção de pretos e pardos ocupados é maior nos ramos agrícola, construção civil e prestação de serviços, enquanto os brancos estão mais presentes na indústria de transformação, no comércio de mercadorias, na área social e na administração pública.
Dos porões dos navios negreiros, veio o samba, o candomblé, o carnaval, o sabor forte de nossa comida; crenças e hábitos que em nós estão intrínsecos e que faz de nós o que somos: povo mestiço. E como diz o poeta Caetano Veloso, “O coração, que é soberano e que é senhor, não cabe na escravidão, não cabe no seu não, não cabe em si de tanto sim: é pura dança, sexo, glória… E paira para além da história”.
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